segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Prova de amor



É que A mãe sai do serviço cansada e fica na fila do mercado pra me trazer AS laranjas.
Eu retribuo com outra prova de amor:
Laranja! Eu te amo! Um beijo acidoce na tua imperfeição redonda.
No entanto, tu tens o destino traçado, e eu sou deus.
Sou teu último suspironhack.
Devoro-te toda, com todo prazer.


O que a gente ama, quer dentro, para ninguém roubar.
E depois, quando a luz no final do túnel apagar, eu menina bichumana, serei toda húmus,
com todo prazer.
E crescerei laranjeira.
Bem ligeira, fá-la-ei nascer novamente.
Recompensa.
Compensa
Nãocompensa
Nãopensa.
Minha mãe sabe exatamente como me agradocicar.
Mas não sou madura ainda. Sou um tanto azeda.
Minha casca, que brilha (tão novinha, no entanto, tão enrugada, pecado!), ainda é grossa.
Devo estar protegendo demais meu sumo vermelho.
Laranja.
(e no nosso destino comum,
os vermes também vão amá-la.
Da forma mais bruta e pura, eles - que não tem coração
E amam. )
Sou verme.
Sou acidoce tal como (e como!) laranja.
Sou verme-lharanja.
Deixo rastro entre os dentes.
Sou difícil de sair.
(Sorria no espelho e verá meu atrevimento)
Sou difícir, ein.

Ela tem o mar no nome, a minha mãe. A ela, não preciso provar nada. É que, às vezes, assustada e tímida, descobre tudo - olho fixo nos olhos dela, mergulho nas suas profundezas, afogo-me toda.
Mas nunca falta ar.

sábado, 25 de setembro de 2010




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domingo, 19 de setembro de 2010

Café mais amargo





Nem oi
Nem tchau
Minha amiga,
Estamos nas entrelinhas
Estamos nos entreares
Estamos nós entretodos
Estamos entretidas em viver,
Porque morrer é tão mais acessível.
Pura semente, plantamos nosso jardim, puramente.
Encontro você lá pra tomarmos um café e comermos muito, como de costume.
Deitaremos na mesma rede, desengonçadas, e veremos o céu e as estrelas.
Abraçamo-nos nas entrelinhas
Abraçamos as estrelinhas
No diminutivo para caber entre nossos braços.
Levarei algumas comigo
Pois não sei se vou voltar
Não vamos mais voltar.
E então, minhas mãos serão o céu e o infinito.
Como um pedido para vivermos um pouco mais.
Para vivermos.
Mais.
Sozinhas.
Menos.
Sozinhas.

Ração humana

Sem nenhum valor agregado.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Violência no jardim




E eu gosto tanto (esta expressão é tão difícil!), pois a sinto antes da sua chegada (isso confessa nosso amor – muitos amores não devem ser confessados), e a cada passo que se aproxima de mim, mais aguçado meu olfato, eu sinto mais intenso o seu cheiro, nas ruas, nos ares, nos outros, nossos troncos, folhas, flores pétalas sépalas ginec- eu e a primavera.
Ela sussurra levemente em meus ouvidos e anuncia. E eu agradeço com sorrisos que pedem para serem. A palavra equinócio é só pra cumprir o seu papel, nada mais.
A mãe da menina, cheia de ternura, comprou o tecido, tecido bonito aquele, simples, mas bonito. A menina, cheia de candura, menina bonita ela, queria o vestido pra rodar. Ele era todo flores. Ela era toda cores. A menina e o vestido.
Muito cuidado, muito trabalho, a mãe queria ver a filha rodar, a mãe queria ver o céu nos olhos floridos da filha. Filha que roda olhando pro alto.
Ela só queria rodar no jardim, queria o vento e talvez uma folha caindo no seu rosto.
É 23 e a mãe a entrega o vestido, o qual já estava sendo há muito preparado, mas era inverno e menina colorida no cinza é pecado. Moças, mães e seu pudores. Maçãs, afagos e seus pecados.
O primeiro contato, as pontas dos dedos e a textura leve do tecido, o fechar dos olhos, e o sorriso e o êxtase, para sempre nunca mais será o primeiro. Menina roda de dia com o sol na cara, pede “por favor” para o outono fazer uma folha cair no rosto e partir assim que o fizer, pede desculpa pela indelicadeza. Já o vento vem sem pedir licença. Às vezes gosta dessa brutalidade, com vergonha. Faces vermelhas e toda feminilidade.
O céu gira na sua íris e a mãe, sempre cabeça baixa – uma humildade de opressão, vê o céu pela primeira vez nos olhos da filha. Mãe pisca os olhos...
Faces vermelhas e toda feminilidade. O vento e toda sua brutalidade. Sem pedir licença, invade-a. O primeiro contato. Menina é vento por dentro e não pode chorar porque água no vento evapora. Só fica o sal. Logo você que era tão doce. Logo você, menina. E o vento foi embora, ele que veio pra te sangrar. A mãe não te olha mais nos olhos, agora só há chão. Menina não pode mais sonhar.
Vestido florido não cabe mais, a criança-vento cresce dentro de você. Vestido preto você vai vestir, é morto o céu nos olhos, é duro o chão o qual tem pra pisar. E você é quem vai costurar. Mãe foi alcançar o céu.
O inverno chegou sem ter verão. Criança Ventania já tem roupa pra vestir. O pano florido, o primeiro contato, a ponta dos dedos, o primeiro contato, o vento...fizeram-te nascer. A mãemenina abre o baú, e entre fotos, flores secas, papéis amarelos, esta o vestido. Vestido é manto para o batismo. O solo vai te abençoar, criança. Menina vai rodar com a Ventania nas mãos. Menina tem o mundo nas mãos.
Menina planta uma flor na terra.
Menina sai voando.
Mas já é quase setembro.