sexta-feira, 29 de junho de 2012

dedos e lunetas

Uma órbita ocular jazia no meio da palma da sua mão. Queria piscar, mas estava sozinha, sem cílios, sem pálpebras, sem palavras. Silenciosa e centralizada. E você a observando, na periferia do que era, com um medo visceral, querendo lhe dizer algo adstringente. Mas o buraco negro no lado esquerdo da face adentrava às suas outras e já não sabia qual era a que lhe pertencia. Tantas faces, tantas órbitas, agora todas desequilibradas na mesma e única mão com seus exatos cinco dedos, que eram como pernas estendidas de bailarinas acenando estrelas no céu. Sentia, dilacerado, a falta de um dedo - é desafiador ser ímpar. Não há posse sobre rostos furados. São escorregadios. Findando a mutilação em um aplauso, o omelete de pupilas e órbitas transfigurou o trágico em constelações que orbitavam suas crateras. Voavam cristalinos. Na mão, no lugar antes ocupado, ficara a chaga. Orgulhosa, deixava fluir o vento até os seu olhos quando as mãos envergonhadas eram atraídas pelo rubor do rosto. O ar os atingia apenas porque a mão era um alvo furado - pelo dedo par que se omitia.

terça-feira, 26 de junho de 2012

sobre um ovo verde desossado


Quando se invertem os papéis, e se amassam as pessoas, e engolem-se vidros, e quebram-se rostos, eu sou o oposto. Caindo da janela, eu plano feito uma folha de papel A4 reciclada. Apalpada pelo vácuo, recuo no caos. Com textura de veludo, perco meus ossos. Eles saem pelas minhas orelhas úmidas. Dói razoavelmente, mas me torno tãotãotão leve, leve, feito pena seca de ave em extinção, que a dor cai pesada no chão e morre pisoteada por sapatos de couro legítimo. Meus ossos caem nas cabeças das pessoas. O som do contato ecoa no oco delas. Mas eu não ouço nada, e não as toco, sou onisciente. Meu tímpano ainda sangra e meu equilíbrio também fica um pouco defasado (nessas horas, eu aproveito, danço desafiadoramente). Alguns atravessam os olhos dos que olham, confiantes, para o céu pré-temporal. Algumas, nem sentem, pois têm um amortecimento de última geração comprado com o cartão de crédito, sem limites, em um shopping limpolimpolimpo e branco, muito branco, e vermelho. Minha consciência pesa, pois meus ossos densos tombam violentamente seres que andavam distraídos. Alguns levantam-se, ajeitam o paletó e seguem (cavando o asfalto). Outros, nervosos, brutos, selvagens, roem o osso que lhes acertara. Eu plano tridimensionalmente aparentemente parada. Mas a terra esta girando bêbada de chá verde e shakes e vinhos. Quando embriagada, eu penso em reações químicas: um osso, algo tão quase concreto, transformando-se em gotas de chuva. As crianças são alvos das gotinhas. E brincam, nas poças dos moços que seguem(.), com pés descalços e macios e enrugados. As rugas formam caminhos e labirintos que eu percorro rolando feito uma bola de carne, de segunda, amassada (para ocupar menos espaço). O seu labirinto é responsável pelo seu equilíbrio... Eu li em um livro de biologia, certa vez. E me perdi calculando o peso na balança. O exato é exatamente um ovo. Pode ser sua refeição, ou um animal insignificante piando significações. A terra é elíptica e eu faço planos redonda. Como uma galinha grávida.


quarta-feira, 20 de junho de 2012

Vintzxi reaix


Eu amo minhas havaianas amarelas. E um dia vou ter uma bicicleta. Vou sim! Deixei a Ferrari pra trás. Apesar de o vermelho ser uma cor muito bonita. Mas, nas minhas unhas, ele também cai bem. E, na minha boca, fica muito zeczy, às vezes. Só tenho que cuidar para o vermelho não descascar e o batom não borrar, porque, ai, vou parecer uma mulher tentando seduzir Ferraris. Mulher da vida, acho muito positivo esse jeito de falar. Da vida, acho que eu quero ter esse aposto um dia: Talitha, mulher da vida. No bom sentido. E no mal também, se eu quiser. Sou atriz e eu posso. E teria pernas muito sedutoras, pois andaria de bicicleta.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Neblina

O que me preocupa nessa vida são olhos cansados e mãos encolhidas.
Com a testa enrugada, pulo cordas.
Enquanto crianças correm
Escorrem palavras e filhos
células mortas
dizendo 
que chove lá fora
e o bueiro é em mim


tem uma goteira pingando
orvalhos nos meu cílios


(04/02/2012)


Um pé no chão e outro no céu. Se eu tivesse mais pés, eles estariam soltos no ar e com as unhas mal pintadas de vermelho. Ai, eu não teria responsabilidade sobre eles. Eles poderiam acertar sua cara ou sua bunda quando ventasse, ou quando brisa, dançar um sapateado sem som, no ar mesmo...Esses outros pés são a vida, e fazem dança por ai...E têm chulé. Mas há o vento.

Suco de tomates

Não desvie o olhar. Quando você resolve coçar a pele em um ato neurótico ao invés de expurgar a ferida no cerne, você estará a espalhando para suas mãos. E a vergonha a levará aos olhos, sensíveis, e será tarde demais. Seu rosto é um molho à bolonhesa à base de tomates maduros e transgênicos. Vá à chuva se lavá! Lágrimas salgadas e sangue desenhando mapas e labirintos na sua face. Poças e crateras para mergulhar em sua alma. Divisor de águas. A chuva se intensifica enquanto você sente o líquido correr em você. Para o mar. Olhos de ressaca. Você já chorou sangue? Já comeu suas remelas de sangue seco? Comer o próprio sumo lhe dá ânsia? Krec krec, mastigar a própria carne pode dar prisão de ventre...ou libertar sua mente;
Ou
“a sua alma é uma multidão com os braços soltos balançando com o sopro na xícara de café da manhã”

Retrovisordenado

(26/02/2012)
A.sentou-se no banco amarelo. No fundo havia um jardim verde escuro. Fixou o olhar na rua que corria à frente com pernas de passarinho. E olhou dentro, e escorreu fundo. Pessoas e rodas e risos giravam ao redor. Cirandas de crianças sem pernas. Descansou os olhos e eles tornaram-se duas bocas em gritos. Quando os abriu, estava em uma mesa enorme com as pessoas que almoçou e jantou quando suas pernas ainda não tocavam o chão quando sentada na cadeira, e balançavam descontroladas no ar. Era um teto quebrado, inclusive as telhas. Todos os pratos preenchidos, uns mais, outros menos. O prato dela era um filhote de passarinho assado. Ela nunca comeria. E cada um olhava para o próprio. Vezenquando um olho verde de menino olhava o bichinho no prato dela e depois os grandes olhos dela. E desvia o olhar para seu suco de maracujá. E vê-lo beber a calma a fazia sorrir de canto, mesmo com um buraco na barriga. Trasvezes um olho de jabuticaba de cabelos curtos e leves de menina ou mulher que come pouco e é bonita, oferecia um pouco da sobremesa. Mas a boca de A. estava fechada. Os outros se lambuzavam tanto que tapavam os olhos com molho escuro de feijão. E conversavam: A. não quer comer porque não quer. E mastigavam farturas que na verdade eram perninhas secas de ave. Mesmo sem comer A. vomitou na mesa inteira alguma coisa abstrata. E as telhas rachadas caíram sobre as cabeças. Agora A. estava no banco amarelo, sentada com os pés que já alcançavam o chão. Alguns estranhos sentaram ao lado. Houve os que apoiaram a cabeça em seus ombros murchos e partiram. Mas alguns, com roupas em trapos, tiraram do bolço um pão e o dividiram em dois. E ela se lambuzou de pão seco. Mesmo com um buraco no peito.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Húmus corlírio

Disse para eu girar com os tecidos coloridos soltos em trapos no corpo. Disse que se misturariam sabores e fiapos. Disse que, em algumas ocasiões, eu rasgaria pedaços dos panos. E que minhas mãos teriam energia e força para isso. E eu não me surpreenderia tanto assim, pois eu estaria dançando durante os acontecimentos. E que as partes desnudas seriam pelos e pele arrepiados, lembrando-me grama. E viria o vento, pra lá e pra cá, nas gramíneas. Eu rolaria nelas. Perderia mais alguns trapos. Meu corpo seria arrepios com cheiro de mato e terra. Haveria pequenos galhos nos meus cabelos armados. Eu passaria minha mão cheia de terra no meu rosto cheio de espanto, lavando-o com o lar das minhocas. Sorrindo, meus dentes pareceriam mais brancos. Por causa do contraste. As cores do que eu vestia estavam pintadas de um ritual infantil e um pouco demente. E o que eu não vestia mais era minha nudez me acobertando do que eu não era. Disse que eu veria meu rosto refletido em um lago cinematográfico, que era, na verdade, uma poça em baixo de um balanço velho de um parque abandonado. O buraco que acumulou água para refletir rostos transfigurados e reais, fez-se dos tantos pés de crianças que freavam para parar uma brincadeira. Crianças são sérias e sentem a vida. Adultos dizem saber das coisas. Mesmo que não saiba do que se trata exatamente, prefiro aquela. Mas eu sinto uma coceirinha. Dessa vez não é por causa da grama. Disse que eu mergulharia na pocinha de água terrosa, e seria um lago fundo da Europa medieval. Sairia com os panos de outrora grudando e pesando no corpo. Algumas partes desintegrar-se-iam e ficariam boiando na superfície. Outras se impregnariam no corpo formando desenhos com texturas intangíveis. Um tigre correndo na floresta de dentro dele. Um passarinho pousando nos galhos da minha cabeça. Descobrindo flores entre os fios de cabelo. Bicando minha pupila para eu ver como ele vai crescer bem alimentado. Disse que eu rasgaria meu rosto como se fosse tecido. E que iria embora com a correnteza. Chove cristalino lá fora em mim.
EU COMI TODAS AQUELAS PALAVRAS. TRITUREI-AS COMO UM TIGRE FAMINTO DILACERANDO UMA CARNE VERMELHA. O SANGUE ESCORRIA DA MINHA BOCA CONTRA A GRAVIDADE INDO AO ENCONTRO DO AZUL QUE ESCORRIA DOS MEUS OLHOS. E AI, EU AFUNDEI MEUS PÉS DESCALÇOS NAS POÇAS DAS MINHAS BOCHECHAS. AFOGUEI-ME, DILUÍ-ME, TOMEI AQUELE LÍQUIDO, O QUAL PREENCHEU MEUS PULMÕES. TOSSI A MORTE EM ALTO MAR. ARROTEI UMA POESIA, EM DECOMPOSIÇÃO, DIGERINDO-SE A SI MESMA, COM A MESMA BOCA QUE DILACERARA MÚSCULOS E CORAÇÃO DE UM BICHO QUE SE ESCONDIA NO MATO. AGORA, FICOU DENTRO DE MIM UM ANIMAL MORTO COM FRASES ENTALADAS NA GOELA.

terça-feira, 12 de junho de 2012

O meu não saber deixa minhas mãos vazias
(elas têm o peso do vento nas folhas outonais)
ele me assopra para um abismo
solto-me da árvore e vou caindo
esqueço de respirar
aqueço-me no ar que se movimenta
fazendo-me voar ou cair mais
perdi as dimensões
só sei sobre eu ser pequena
desapareço menina no colo das minhas mãos
que trememtrememtrem bailarinas
transcendentais