sábado, 16 de julho de 2011

Detalhes dos seus retalhos - Parte II



O sol par te

.............É realmente ou ficcionalmente estranho; quando o vejo partir, mesmo de costas, vejo sua fronte e todas suas dimensões. O sol se pondo. Seus contornos pulsando em mim. Sua retidão fazendo-me contorcer. Lembro-me, como em um flash, de quando tive coragem e passei meus dedos pelo portão de uma casa qualquer. Caminharam entre os intervalos da grade. Sentia o frio do toque e o cheiro de ferro. O gesto de uma criança distraída. Eu era feliz vivendo aquele instante. Meus passos de iniciante... Brincando com as pedrinhas no chão. Nem sei por que, é sempre as vezes que eu amo você inteiro a meia luz.

Cor do texto
Nudez

................Retiro a espessa camada de súber que me recobre. Respiro. Você retira minha dor, atira-a de um precipício. Recolhe-me em seus braços, colhe uma flor. Planta em mim. Um crime sem suspeitas, cúmplices, vestígios. Um jardim secreto de segredos meus, tão seus. Céus! Eu me proíbo. Eu o permito. Valorizo sua imensidão, esta que preenche minha pequenez e todas minhas lacunas, vácuos, frestas. Vazios, enfim. Quase explodem. Placenta e Big Bang e eu recomeço cercada por estrelas. Lindo, lindo, lindo! Saio do ventre inacabada, mas com estrelas prontas nos olhos. Suspiro!


Desafinação bonita

................Minha casa da dó, da minha casa dou a ré, minha casa é de mi, minha casa não tem sofá, minha casa é o sol, minha casa é lá, minha casa é de si. Você canta sem acordes, sem notas, sem instrumentos. Você me toca com as pontas dos dedos. Arrepio sem me arrepender. Um dó sustenido, eu só no seu esconderijo. Sua bochecha da vontade de morder. Seu pescoço me convida. Você lê um trecho daquele livro em voz alta. Vira música. Não me vê, mas eu estou cega. Vejo coisas e cores, seus sabores. Sentimentos graves. Para me fazer dançar, desafinada. O contorno fino da sua mão é dono da imensidão do meu olhar.

7 Eros

................Eu me desisto, mas não consigo. No meu baralho sempre falta uma carta, e eu não sei jogar. Mal posso parar e já cansei de não andar. Meu coração sente falta de um pedaço, de uma válvula, de uma veia... Do sangue que não quer correr. Como eu chamo isso que me faz cócegas e me arranha ao mesmo tempo? Não tenho tempo pra te respirar, não tenho ar pra viver sem te ter. Sou toda amor, cheia de tropeços. Amor que sufoca, ofusca, quer ultrapassar-me, dar-me... Predisposta a amar, que sou. Faz sol. Sou soul. Amar, intransitivamente. Objeto, pessoa, nada... Simplesmente amo complicadamente tudo. Não o precisamos chamar, ele vem sozinho, sem pedir licença. E nos invade, amém. Amem intransitivamente, congestionantemente. A batida brusca não deixará nenhum morto tragicamente. Apenas vítimas, dele que é divino. Sinais verdes. Sou pedestre e aprendi a voar. Mergulho, não aprendi a nadar. Andarei de fusca quando tiver azul pra comprar. Sinas amarelas. Viro páginas de um livro em chinês. Decifro símbolos que desenhei no cimento. Em cima de mim, no balãozinho do pensamento, há um moço bonito que me olha bonito, sorri bonito e me ama feio ou bonito e por todos os lados. A carta que faltava era um sete de copas. Meu deus! E meu moço não tem rosto. E eu sou o resto do que eu fui e do que serei. Sereia que voa e não sabe cantar. Encontro deuses nos meus sonhos de não ser só. O moço bonito vai embora, porque existe borracha e eu sei apagar o que não é. É ra uma ave zzz. To com sono e vou dormir. Talvez cure minha lucidez. Talvez mate lúcifer. E sonhe com o seu rosto. E sinta cócegas...

Um comentário:

Marília disse...

"Minha casa da dó, da minha casa dou a ré, minha casa é de mi, minha casa não tem sofá, minha casa é o sol, minha casa é lá, minha casa é de si."

Incrivelmente perfeito.
E os 7 eros também.